20 fevereiro 2009

América
Obama procura aliados, uma equipa e um rumo para o país

O primeiro mês de Barack Obama à frente da Casa Branca fica marcado por quatro desistências na equipa que escolheu para o acompanhar. A política externa foi a grande prioridade, mas as decisões de encerrar Guantanamo e acabar com a tortura nos interrogatórios desviaram as atenções de outras medidas polémicas.

Entre as primeiras ordens executivas assinadas pelo Presidente Obama passou despercebido um documento que autoriza a CIA a manter o chamado programa de rendição de suspeitos, um método instituído por George. W. Bush que assenta em raptos secretos e transferência de detidos para países com acordo de cooperação com os Estados Unidos. Obama, recorde-se, prometeu combater o terrorismo, mas com princípios.

Miguel Morgado, professor de Ciência Política na Universidade Católica, afirma que a realidade da luta contra o terrorismo é implacável e considera, por isso, que Obama vai “desiludir muitas das pessoas que apostaram nele como representante de um ideal humanitário que Bush teria traído”.

Com o encerramento da prisão militar de Guantanamo em um ano, o fim das prisões clandestinas da CIA no estrangeiro, a proibição do recurso à tortura nos interrogatórios de prisioneiros e a recuperação de tratados internacionais como a Convenção de Genebra, é unânime que Obama acabou, de forma simbólica, com um rol de instituições da Administração Bush e começou a dar forma ao que no discurso de inauguração chamou de “era da responsabilidade”. Fica por saber até que ponto.

Ainda na política externa o vice-presidente Joe Biden foi a Munique avisar que a América vai pedir mais aos seus parceiros: chegou a altura de o aliado europeu querer cooperar, porque haverá outros dispostos e ansiosos em dar o braço aos Estados Unidos. “Para mobilizar esforços diplomáticos, económicos e militares que permitam ultrapassar a questão do Afeganistão”, para onde os Estados Unidos vão enviar mais 17 mil soldados, Obama “vai precisar de todos os aliados que encontrar”, diz Miguel Morgado.

Democratas e republicanos de costas voltadas

Dentro de casa, quatro demissões em quatro semanas mancharam a imagem de Obama e embora não seja inédito um Presidente demorar a fechar a sua equipa, ainda não há um nome para o importante cargo de secretário da saúde — Obama prometeu um sistema de saúde de acesso universal —, depois do abandono de Tom Daschle, a braços com irregularidades nos impostos. Já o republicano Judd Gregg feriu o desejo de uma Administração bipartidária, ao abandonar a pasta do comércio alegando diferenças ideológicas.

Esse afastamento entre democratas e republicanos está, na opinião deste professor universitário, vincado sobretudo no plano de recuperação da economia, que teve votos contra dos republicanos nas duas câmaras. “E com boas razões para isso”, diz Morgado, para quem a componente proteccionista do plano desenhado por Obama não é novidade e é perigosa. Também ao revogar a proibição de financiamento às instituições que promovem o aborto, o Presidente entrou em confronto com os republicanos.

Nos últimos três meses pelo menos 700 mil americanos perderam o emprego, o que é apenas um indício de que a Administração norte-americana ainda não apresentou um plano para os Estados Unidos. “A promessa de um rumo claro para o país está a desfazer-se todos os dias”, mesmo apesar das circunstâncias, como a grave crise económica.

Sabendo que 30 dias é muito pouco para se avaliar um Presidente, Miguel Morgado, que durante a campanha apoiou John McCain, faz um balanço negativo da presidência de Barack Obama. “Até agora deu sinais de um Presidente hesitante, confuso, com graves problemas para resolver do ponto de vista da sua equipa, das relações com o Congresso e com os republicanos. É cedo para um juízo, a informação disponível é pouca, mas permite tirar esta primeira consideração, que é negativa”. (fim)

RR em 20Fev2009

09 fevereiro 2009

Ambiente
“É frequente a tutela política intervir quando entende que a solução devia ser outra”

As avaliações de impacto ambiental são muitas vezes objecto de pressão por parte do poder político, seja para encurtar os prazos, seja para alterar a decisão técnica final. Quem o diz é Henrique Pereira dos Santos, um técnico do Instituto da Conservação da Natureza (ICN) que assinou o primeiro parecer negativo ao Freeport de Alcochete, porque o projecto violava o Plano Director Municipal de Alcochete. A divergência de entendimentos levou a chefia da altura a tomar conta do processo.

Em entrevista à Renascença este antigo Vice-Presidente do ICN — de onde saiu recentemente, depois de ter abandonado a Direcção das Áreas Protegidas do Norte — diz ainda que a aceleração dos processos não é ilegítima, mas que essas decisões raramente são fundamentadas, e que isso acontece com todos os governos.

Existem muitas justificações razoáveis para se acelerar uma avaliação de impacto ambiental (AIA), diz o técnico, mas na maioria das vezes, quando se apressa uma avaliação há uma pressão de natureza política. “O que me preocupa é a falta de formalização da decisão e, sobretudo, a falta de fundamentação, o que torna discussões sobre estas matérias extraordinariamente escorregadias”, alerta.

Henrique Pereira dos Santos diz ainda que os técnicos são muitas vezes chamados a explicar aos decisores políticos as opções que tomam. O problema, diz, é quando a conversa passa do mero esclarecimento de dúvidas e de troca de opiniões diferentes “para passar a ser uma coisa tipo: tenho o gabinete de não sei quem a dizer que quer isto aprovado e façam lá o que entenderem para aprovar isto”. (fim)

José Pedro Frazão e João Pedro Vitória - RR em 06Fev2009 | Áudio disponível na caixinha aí do lado.