19 abril 2008

Entrevista a Alyn Ware
Deputados por um mundo sem armas nucleares

Recusando representar algum tipo de lobby e preferindo ser visto como um educador para a questão nuclear, Alyn Ware esteve em Lisboa pela primeira vez e conseguiu que dois deputados aderissem aos Parlamentares pela Não-Proliferação e Desarmamento Nuclear (PNND, em inglês). A organização reúne cerca de 500 associados, deputados em mais de 70 países, e não esquece de repetir que existem milhares de bombas nucleares prontas a serem usadas: só nos Estados Unidos se estima que sejam 250 mil ogivas. Alyn Ware é também um dos advogados que dirigiu o processo que levou à condenação do Estado francês pelo Tribunal de Justiça Internacional, em 1995, por causa dos testes nucleares no atol de Mururoa.

O que é que um país como Portugal pode fazer pelo desarmamento nuclear?
Portugal está numa posição significante porque é membro da NATO, que apoia o armazenamento nuclear preventivo. Por outro lado, todos os países da NATO, tal como a maior parte dos países no Mundo, fazem parte do Tratado de Não-Proliferação de Armas Nucleares e do compromisso de trabalhar para um Mundo livre de armas nucleares. Portugal pode incentivar ao desarmamento.

Encontrou-se com vários deputados portugueses, que resultados produziram essas reuniões?
Tivemos reuniões positivas com alguns deputados. Reunimos com Leonor Coutinho, da Comissão de Negócios Estrangeiros, que aderiu à nossa organização. Pedro Quartim Graça, do Partido da Terra, eleito pelo PSD, também aderiu… E ainda reunimos com um assistente do Bloco de Esquerda, que assegurou que o partido vai participar nalgumas das nossas acções. Também reunimos com algumas organizações não governamentais, com quem estabelecemos relações de colaboração, incluindo o Conselho Português para a Paz e Cooperação, que há vários anos tem estado envolvido nestes assuntos.

E com José Lello?
O Sr. José Lello é o presidente da mesa da Assembleia da NATO e a NATO ainda tem a possibilidade terrível do uso de armas nucleares, recorrendo a armas norte-americanas, francesas, ou inglesas. Por isso é muito importante que a NATO avance nesse ponto e se afaste da confiança depositada nas armas nucleares. Levantámos essa questão ao Sr. José Lello, e a nossa organização vai levar a cabo um evento na próxima assembleia da NATO.

O que podem os deputados portugueses fazer se aderirem à organização?
Nós não requeremos nenhuma actividade específica por parte dos deputados. Temos um leque de opções a que eles podem voluntariamente aderir. Mas, por exemplo, já referi antes as armas nucleares tácticas que estão armazenadas na Europa em países da NATO… Alguns deputados noutros países como a Bélgica e Alemanha estão a adoptar resoluções para acabar com as armas tácticas norte-americanas e as russas. Talvez os deputados portugueses pudessem pegar nesse assunto. Outra possibilidade é uma proposta que está nas Nações Unidas com vista à negociação de um tratado internacional para abolir completamente as armas nucleares. Actualmente Portugal vota contra essa resolução. Isto é um aspecto fundamental para a nossa organização: convencer países que não apoiam essa resolução a apoiá-la quando for novamente a votação este ano.

Que países têm, actual e publicamente, armas nucleares?
Há cinco Estados nucleares, reconhecidos ao abrigo do Tratado de Não-Proliferação, que são os cinco membros permamentes do Conselho de Segurança das Nações Unidas: Estados Unidos, Rússia, China, França e o Reino Unido. Além desses, Índia e Paquistão testaram armas nucleares em 1998, demonstrando que as têm. Acredita-se que Israel tenha armas nucleares e há mesmo provas disso. E a Coreia do Norte retirou-se do Tratado de Não-Proliferação e também testou uma arma nuclear.

Por isso, ao todo são nove os países que têm armas nucleares actualmente. Outros podem desenvolver armas nucleares num futuro próximo se tiverem urânio altamente enriquecido, ou se extraírem plutónio dos resíduos dos seus reactores nucleares. O Japão tem essa capacidade, o Brasil tem programas de enriquecimento de urânio, o Irão está a começar, a Holanda tem urânio enriquecido, e há mais alguns países que não têm nenhuma arma nuclear agora, mas podem tê-la no futuro.

O Irão não tem armas nucleares e reclama que o seu programa nuclear é apenas para fins energéticos… O Irão representa um perigo?
O Irão não tem, actualmente, urânio enriquecido, que é o que é necessário para construir uma bomba, mas pode enriquecê-lo a esse nível. De momento está sob supervisão da Agência Internacional de Energia Atómica, que está a verificar que não têm material capaz de ser utilizado em bombas, mas é uma possibilidade.

De todos os países que já visitou, onde encontrou maiores dificuldades em divulgar a causa e recolher apoio de deputados?
Claro que nos Estados Unidos há problemas com a actual Administração, que não atende às suas obrigações de desarmamento nuclear, embora isso esteja a mudar e nós temos tido desenvolvimentos positivos junto do Congresso, com várias resoluções acerca deste assunto. E esperamos que a nova Administração norte-americana dê alguns passos em frente. A Rússia tem sido muito difícil, mas temos, no entanto, alguns deputados que têm levado a cabo algumas iniciativas e no caso das armas tácticas pode haver alguns desenvolvimentos na Rússia. Depois há sempre as dificuldades da Índia e do Paquistão, que recentemente testaram armas nucleares e por isso estão mais relutantes em trabalhar pelo desarmamento nuclear do que no passado.

Estes são só alguns exemplos, eu acho que em todos os países há sempre pontos positivos e negativos. Mas também acho que o mais inspirador é a Zona Livre de Armas Nucleares, que já são 130 países que se comprometeram não só a não ser defendidos por armas nucleares, mas a proibi-las no seu território. E isso já é a maioria dos países no Mundo. E agora há ideias para uma Zona Livre também na Europa, por exemplo, e nisso Portugal pode pensar em aderir, se for para a frente. (fim)

RR em 16Abr2008. Áudio aqui.

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